Nascido em Ílhavo, desde 79 que Viriato Teles é jornalista, passando pelas redacções de O Diário, Sete, O Bisnau, O Jornal, Visão, O Inimigo, entre outras colaborações. Dirigiu programas de televisão, foi cronista "de escárnio e maldizer" na TSF e autor de canções premiado. Em 83 publicou Zeca Afonso: as voltas de um andarilho e é, actualmente, o nosso chefe de redacção do GrandAmadora. Alguns amigos terão recebido, como presente ou amortização de uma dívida, uma pequena edição caseira de alguns dos poemas de Viriato Teles, mas Margem Para Dúvidas é a sua primeira obra poética, para quem só o possa conhecer segundo as leis do circuito comercial.
Quem abra o livro e leia o prefácio afectuoso de Fernando Alves, não está preparado para um murro no estômago. Que não é um murro anónimo, tem título: Três Olhares sobre Manágua, um elogio à loucura nas noites claras de outro continente. Também um murro com uma data, o ano de 84, para o poeta registar o desejo de impossível e os amigos "felizmente loucos". Mas neste livro de quase um cento de páginas, Viriato Teles visita a noite de muitas cidades, reencontra amigos enquanto desencontra revoluções e outros sonhos transgressores.
Nos dois capítulos que se seguem, Factura Exposta e Outras Paisagens, acompanhamos as andanças do autor - suponho que quase sempre em reportagem - e é-nos iluminado esse recanto que o repórter deve, por questões deontológicas, omitir da sua prosa regular. Conhecemos os olhos de Julieta reiventada numa estadia em Verona; levamos outro murro no estômago ao saber da tristeza nos olhos de Peter Arnett, em directo, satélite e tudo, desde as ruínas de Bagdad e sabemos da alegria quando o mundo volta a ver os olhos de Mandela.
Viriato Teles transporta para o seu verso a disciplina da escrita dos jornais, mas substitui o facto pela candura, o relato pela indignação. Senta-se à mesa da esplanada e vê o mundo acontecer. Estende a toalha de papel e enquanto relata a história com a mão exacta do repórter, vai cantando a poesia da história com a outra mão, mais lenta, com mais tempo para se enrolar num copo ou acender um cigarro.
Em Cavaqueira, o capítulo seguinte, satiriza o ritmo dos dias com ingenuidade que só um sátiro, a tentar fazer o verso pequenino que o faz tão grande, a ridicularizar os tempos modernos dos pensos higiénicos tão eficientes que "o meu namorado nem sequer nota que eu estou com o período". Mas a partitura fecha em tons de carinho, o poeta embevecido com o nascimento de um filho, no final a nota tónica é a esperança de uma nova geração que não tenha que se desiludir.
Viriato Teles, a escrevinhar o azedume das desilusões ou a doçura das esperanças, faz lembrar um gato que vai arranhando e arranhando na porta até que lhe dêem de comer ou que o mundo se decida a mudar um bocadinho. No tempo do pimba que, não se enganem!, já contamina há muito a poesia portuguesa; num país de hinos e odes heróicas, enfim, num país de poetas, felizmente também há quem se ocupe de fazer versos.