Editada em 2001 em opúsculo publicado por iniciativa da organização do Festival de Música Popular Portuguesa da Amadora, a bibliografia seleccionada e as fichas de leitura apresentadas não pretendem ser uma selecção exaustiva, mas sim um conjunto de referências que permitam compreender a música popular portuguesa, no seu sentido tradicional e contemporâneo.
A selecção de fichas de leitura para publicação online é mais reduzida do que a edição original em papel. Os textos mantém-se tal como foram escritos e, em alguns casos, já não seriam aplicáveis a reedições acrescentadas, que entretanto fotram feitas. As notas estão ordenadas por ordem alfabética do último nome dos autores dos livros mencionados. Nos casos em que são citadas, em fichas próprias, várias obras de um autor, as referências seguem a ordem cronológica da respectiva publicação. As indicações em caixa alta remetem para autores ou títulos analisados autonomamente neste caderno.
Introdução
Não é nossa pretensão enumerar neste caderno todos os títulos que integram a bibliografia dedicada à Música Popular Portuguesa – a qual, tomada no seu sentido mais amplo, já abrange algumas largas dezenas de títulos.
A escolha dos livros referenciados em fichas próprias não foi exaustiva, como tão pouco o será a bibliografia geral que surge em complemento das notas de leitura e em que se procurou fazer um levantamento tão completo quanto possível das obras existentes e, de algum modo, referenciadas com o género, aqui entendido de modo amplo como uma grande área em que cabem os livros dedicados a aspectos gerais ou específicos da música tradicional portuguesa juntamente com aqueles que têm a ver com as diversas variantes da música popular portuguesa contemporânea – criação da cidade, mais que do campo – e dos sucessivos movimentos que lhe traçam a história, desde o fado de Coimbra às criações mais recentes de Fausto, Janita Salomé ou Sérgio Godinho, passando por outras vertentes daquilo que, nos nossos dias, integra o nosso universo telúrico-musical, como o fado de Lisboa – onde hoje pontificam os nomes Mafalda Arnauth, Cristina Branco ou Dulce Pontes, a par de notáveis renovadores do género, como Carlos do Carmo. E José Mário Branco, responsável pelas encenações musicais dos três discos de Camané, a mais segura referência masculina da nova geração fadista.
O trabalho de consulta de fontes e recolha de elementos levou-nos a descobrir outros documentos interessantes, alheios a este tema, mas envolvendo alguns dos seus protagonistas. Serão eventualmente curiosos do ponto de vista historiográfico, ainda que marginais ao processo criativo dos seus co-autores. É o caso do folheto intitulado Programa de candidatura à direcção da UEPF (União dos Emigrantes Portugueses em França), subscrito por José Mário Branco, juntamente com Fernando da Conceição Medeiros, Francisco José Alves, Vítor Manuel Moreira e Fernando Pereira de Medeiros, que o fizeram editar em Paris no ano de 1965. Ou do não menos curioso volume publicado pela Afrontamento, do Porto, em 1973: Uma farsa eleitoral – O caso do Sindicato Metalúrgico de Aveiro: peças de um processo judicial. Os autores, segundo o registo da Biblioteca Nacional, são nada menos que Mário Brochado Coelho e... José Afonso.
O método adoptado para a primeira parte deste opúsculo exigia a selecção, e por consequência a exclusão, de títulos que, mais do que provavelmente, deveriam figurar neste rol – uma debilidade que procurámos colmatar com o alargamento da bibliografia geral a todos os livros directa ou indirectamente relacionados com as diversas vertentes da Música Popular Portuguesa. Pelo apoio recebido, é justo referir os nomes de Avelino Tavares, Júlio Murraças, Leonor Lains e Manuela Crispim. Todos eles contribuíram de algum modo para o resultado final, embora não tenham qualquer responsabilidade sobre eventuais erros cometidos.
Com a exigência dos parâmetros mínimos de rigor que julgamos necessários, mas tendo consciência das limitações inerentes ao carácter sempre subjectivo de qualquer apreciação de obra alheia, este caderno assume-se como um possível guia de leitura – tanto para os que pretendam iniciar-se nas artes da música popular como para os que desejam aprofundar o seu conhecimento deste universo. E, dos livros existentes, é claro que alguns são referências obrigatórias, outros são dispensáveis, outros ainda ficam muito longe dos pressupostos anunciados e acabam por nos dar gato por lebre. O caso mais grave será o de uma provavelmente bem intencionada, mas desastrosa, “tese universitária”, que nos merece uma particular atenção crítica neste caderno – pela mais que comprovada falta de critério e de rigor histórico que lhe era exigida.
Procurámos dar particular atenção aos livros mais recentes ou, pelo menos, mais acessíveis ao leitor comum. Naturalmente, à semelhança do que acontece com a generalidade dos livros publicados, o destaque maior deste caderno vai para os protagonistas dos sucessivos movimentos de renovação da música portuguesa desde os anos 60 – onde se evidenciam por mérito próprio os nomes de Adriano Correia de Oliveira, José Afonso ou Carlos Paredes. Mas não esquecemos as obras sempre referenciais de Fernando Lopes-Graça ou Armando Leça sobre a essência da música tradicional, nem os estudos de mestres como Ernesto Veiga de Oliveira ou Michel Giacometti. A inclusão de alguns títulos pode não ser pacífica como o não serão algumas opiniões expressas, mas julgo ser sempre preferível a polémica à omissão, que é uma das mais terríveis formas de reescrita da história.
A inclusão do fado nesta bibliografia levantou algumas questões sobre as quais talvez valha a pena reflectir. É verdade que o movimento da MPP nasceu da evolução de um género fadista específico – o fado de Coimbra, a que muitos dos seus praticantes preferem chamar “canção de Coimbra”, justamente para a distinguir daquilo a que Lopes-Graça chamava “o famigerado fado”. E é igualmente inquestionável que o fado de Lisboa foi, durante o fascismo, elevado pelo SNI de António Ferro à qualidade de “canção nacional” – um disparate histórico por vezes justificado com a identificação entre a dolência do fado e a tristeza com que muito boa gente insiste em pintar a “alma portuguesa”. Mas o fado não surgiu com Salazar, e é interessante ver o modo nada pacífico como o regime começou por se relacionar com esta arte que, em 1936 (durante uma série de conferências promovidas pela Mocidade Portuguesa, transmitidas pela Emissora Nacional e depois reunidas em livro), era classificada por um palestrante oficial como uma canção de vencidos – um estigma que não era compatível com a força e a ordem da nação imperial que o Estado Novo desejava.
Por outro lado, o movimento da MPP caracterizou-se por opções muito claras, não só no plano estético, como – em muitos casos principalmente – no plano ético. A sua acção nunca se ficou pelos horizontes do universo artístico – coisa, aliás, de que gente como Zeca, Adriano, Paredes ou Fausto nunca foi muito praticante. Os movimentos musicais dos anos 60 e 70 tiveram uma componente social e política, de dimensão hoje talvez impraticável, mas foi isso que lhe deu a identidade que ainda tem. Ora isto foi uma coisa que, no fado, só aconteceu de forma marginal – com as honrosas excepções de Carlos do Carmo, José Manuel Osório e poucos mais
Mas a história, já se sabe, não é um processo linear, como não o é a sua interpretação à medida que nos distanciamos dos factos. E se ninguém hoje pode negar que o fado foi, institucionalmente, um instrumento do salazarismo, também já só um tolo poderá pensar que a tal se reduz o seu papel na cultura popular portuguesa. Falar do fado, quase trinta anos depois da Revolução dos Cravos, deve ser feito como uma reconstituição serena da memória – não para o seu branqueamento, mas dando maior atenção ao que existe nesta arte de tão autêntico que seja capaz de secundarizar as circunstâncias que envolveram a sua criação. Não se trata de revalorizar o passado, mas apenas que conseguir olhá-lo como uma parte do caminho que já percorremos, reconhecendo agora de forma serena aquilo que apesar de tudo valeu a pena ser feito. E se continua a ser um facto que Amália, enquanto tal, nunca se envolveu com o movimento da MPP, também não deixa de ser facilmente constatável que, à luz de qualquer definição, a sua arte é parte integrante do imenso património popular mais genuinamente português.
Boa parte das fontes bibliográficas sobre os diversos movimentos musicais que se desenvolveram a partir de Coimbra – e do exílio, com Luís Cília, José Mário Branco, Sérgio Godinho – encontram-se nos jornais. O Diário de Lisboa, com A Mosca, e o República foram, até ao 25 de Abril, os periódicos que mais atenção deram aos cantautores. Mas referências imprescindíveis são as revistas Mundo da Canção e Memória do Elefante, ambas do Porto. Mais vocacionada para a literatura, mas num “comprimento de onda” semelhante estava, em Lisboa, a & Etc que haveria de dar a editora homónima, ainda hoje uma referência da recusa da mediocridade. Algumas importantes entrevistas com os protagonistas da renovação musical surgiram na Flama, uma revista de informação geral. O mesmo aconteceu com o Cena 7, suplemento de espectáculos de A Capital, e com o Comércio do Funchal. E não é possível esquecer o Musicalíssimo, onde Fernando Assis Pacheco foi, nos anos 70, chefe de redacção – funções que voltaria a desempenhar, uma década depois, no título de maior sucesso da história da imprensa de espectáculos, o Se7e.
A intenção deste opúsculo não passa pela sua sistematização, mas ainda assim reunimos, na bibliografia geral, uma breve nota sobre as publicações periódicas mais significativas para a MPP, ainda que não tenha sido possível incluir as referências bibliográficas completas de algumas delas. E faltam outras que também marcaram o seu tempo – casos da Rádio & Televisão, Plateia, Tele Semana – mas cuja inclusão aqui não fazia sentido, dada a pouca ou nula divulgação que estes títulos deram ao movimento da música popular. Mesmo assim, temos consciência de que haverá outras lacunas neste caderno, que não é um trabalho definitivo, mas antes um objecto em construção – que é como quem diz: para ser riscado, acrescentado, corrigido, se necessário. E nem vale a pena pedir desculpas antecipadas por qualquer erro ou falta de educação. Os livros, como os homens, não conseguem ser perfeitos. Mas podem ajudar-nos a ser melhores.
Amadora, Setembro de 2001
José AFONSO
José AFONSO
Cantares
Ed. Nova Realidade, Tomar, 1966; 4ª ed.: Fora do Texto, Coimbra, 1995
A primeira recolha em livro de textos de José Afonso surgiu em 1966, inaugurando uma colecção que fez história no panorama editorial da época: a Nova Realidade, da qual apenas se sabia que mandava imprimir os livros nas oficinas gráficas do jornal Notícias da Amadora (então situadas na Reboleira, na cave do número 9 da Rua D. Dinis) e fazê-los distribuir pela Raiz - Representações, Lda., cujo endereço era o apartado 66 de Tomar. O volume, organizado por iniciativa de alguns amigos de José Afonso que frequentavam o Café Sírius (na Rua da Sofia, em Coimbra), surgiu quando o Autor era professor em Moçambique: os textos das transcrições das canções eram-lhe enviados por correio e depois devolvidos, devidamente emendados e anotados.
Com prefácio de Manuel Simões, o livro teve uma primeira reedição logo no ano seguinte, acrescentada de “recitativos” de Rui Mendes. Uma outra versão deste livro, publicada em 1969 por iniciativa da Associação de Estudantes do Instituto Superior Técnico, incluía 14 fotos de autoria do moçambicano Ricardo Rangel, prefácio de Flávio Henrique Vara e uma “autobiografia” de Zeca Afonso escrita na Beira (Moçambique) em 1967. Qualquer destas edições incluía textos que José Afonso só viria a gravar mais tarde. Em 1992, uma terceira edição da primeira versão deste livro foi publicada em Coimbra pela editora Fora do Texto, com os textos originais de Manuel Simões e Rui Mendes, as notas de José Afonso e um novo prefácio de Manuel Simões.
José AFONSO
Cantar de novo
Ed. Nova Realidade, Tomar, 1971
Editado já após José Afonso ter sido expulso do ensino e obrigado a gravar discos para poder sobreviver, este Cantar de Novo inclui os textos anteriormente publicados em CANTARES e novas canções, algumas das quais só seriam editadas em disco depois do 25 de Abril. Foi o que aconteceu com as canções para a peça “A Excepção e a Regra”, de Bertolt Brecht, como o Coro dos Tribunais, que deu título ao primeiro álbum de Zeca gravado após a Revolução dos Cravos, mas também a temas como Lá no Xepangara, uma denúncia feroz do colonialismo, que o regime ainda podia tolerar em livro, mas jamais permitiria em vinil.
Aqui se incluem já os temas que irão fazer parte do histórico Cantigas do Maio, gravado nesse mesmo ano em que este livro é publicado em segunda edição. E também temas que irão fazer parte dos discos seguintes: Eu vou ser como a toupeira, em 1972, inclui o belíssimo Por trás daquela janela (dedicado ao militante antifascista Alfredo Matos, que se encontrava preso em Caxias) e o inesquecível A morte saiu à rua (dedicado ao escultor comunista José Dias Coelho, assassinado pela Pide nos anos 60), precisamente o tema que abre este volume; e em 1973, com Venham mais cinco, podemos ouvir pela primeira vez Adeus ó Serra da Lapa, Que amor não me engana ou Paz, poeta e pombas – que ainda hoje permanece como um dos temas mais modernos de José Afonso, apesar de ter sido escrito em Lourenço Marques no ano de 1965...
Referência especial merece o prefácio deste livro, de António Cabral, que na realidade é mais do que uma mera introdução à arte de Zeca e se revela como um estudo muito sério, aprofundado e pioneiro da dimensão poética de José Afonso, um tema que raras vezes foi utilizado pelos estudiosos – com excepções, como a de Elfriede ENGELMAYER em JOSÉ AFONSO, POETA – mas que é aqui desenvolvido de modo muito inteligente pelo ensaísta transmontano.
José AFONSO
Quadras populares
Ed. Ulmeiro, 1980; 7ª edição: Ulmeiro, 1999
Este livrinho é uma curiosidade interessante, embora as quadras nele inseridas façam parte igualmente de TEXTOS E CANÇÕES. Nele se inclui um conjunto de quadras ao jeito popular, algumas das quais vieram a fazer parte de canções de José Afonso, outras destinadas a grupos e colectividades de cultura e recreio – sempre com o objectivo de “animar a malta”. Algumas preciosidades do tempo da intervenção “pura e dura”, como a cantiga Foi na cidade do Sado, escrita a propósito de uma manifestação em Setúbal e publicada em disco pela LUAR, em 1975, que permanece como um excelente exemplo de arte imediatista, de canção funcional e mobilizadora. Estávamos em pleno PREC, era necessário cantar as coisas urgentes. E assim surgiram as mais simples e mais verdadeiras crónicas da revolução. Esta, escrita por Zeca após o 11 de Março, era apenas mais uma: “Foi na cidade do Sado / no pavilhão do Naval / havia uma bronca armada / pelas bestas do capital // Aos sete do mês de Março / quinta-feira já se ouvia /dizer à boca calada / que o PPD era a CIA /(...)/ Eram talvez quatrocentos / gritando a plenos pulmões: / abaixo o capitalismo / não queremos mais tubarões // Lá dentro sessenta manos / do PPD exibiam / matracas e armas de fogo / e o mais que os outros não viam // A um sinal combinado / já quente a polícia vem / arreia, polícia, arreia / que o Totta-Açores paga bem /(...)/ Cai morto João Manuel / de nascimento algarvio / dezoito já eram feridos / ficou o Naval vazio // Justiça pela noite fora / pediu o povo na rua / morte à polícia assassina / amigo, a vitória é tua /(...)”
José AFONSO
Textos e canções
Ed. Assírio & Alvim, 1983; 3ª edição: Relógio d’Água, 2000
Fundamental. Toda a obra escrita de José Afonso está neste livro. A primeira edição do volume, com organização e notas de J.H. Santos Barros, tem a chancela da Assírio & Alvim e data de 1983, o ano em que José Afonso se apresentou em público pelas última vez (nos concertos dos Coliseus de Lisboa e Porto). Nele se incluía quase toda a produção poética de Zeca, além de um conjunto de fotos do espectáculo do Coliseu dos Recreios. Após a morte de Santos Barros (num acidente de viação em Espanha, onde também perdeu a vida a sua mulher, a também escritora Ivone Chinita), a organização de uma segunda edição foi entregue a Elfriede ENGELMAYER, e o livro foi republicado em 1988, seguindo basicamente a estrutura original – um ano após o desaparecimento físico de José Afonso. A estudiosa alemã reorganizou posteriormente todo o conjunto, a que foram acrescentados entretanto outros textos originais, para a terceira edição, publicada em Outubro de 2000.
Baptista-BASTOS
Baptista-BASTOS
Fado falado
Ed. Ediclube, Lisboa, 1999
Em 1999, o Ediclube publicou uma majestosa História do fado, colecção de livros, vídeos e discos compactos, que contempla quase todos os intérpretes com registos gravados. Projecto de grande fôlego, reparte-se pelas diversas variantes do fado de Lisboa e do fado de Coimbra. Este, aliás, tem dois volumes que lhe são inteiramente dedicados, de autoria de José Niza, mas a colecção inclui outros livros, nomeadamente de Rúben Carvalho, sobre o século XX do fado, e de Pedro Caldeira Cabral, sobre a guitarra portuguesa (v. BIBLIOGRAFIA GERAL DA MPP).
Fado falado, outro dos volumes desta História do fado, tem a assinatura de Armando Baptista-Bastos, uma impressão digital de talento e dignidade que fizeram escola no jornalismo e na literatura. Isso seria por si só uma razão suficiente para ler este livro. Mas há mais: o próprio Bastos já teve oportunidade de falar de tudo o que descobriu ao longo desta série de entrevistas, ao estilo directo e nunca asséptico que é a imagem de marca do autor de As palavras dos outros. Se os outros livros desta colecção ajudam a compreender melhor o fado, as entrevistas de Baptista-Bastos fazem-nos conhecer melhor os fadistas. Na sua dimensão artística, mas sempre e principalmente na sua dimensão humana. É esse, afinal, o talento maior de qualquer artista. E aquele que o BB melhor sabe descrever.
Pinto de CARVALHO (Tinop)
Pinto de CARVALHO (Tinop)
História do fado
Ed. Empresa da História de Portugal, 1903; reed. Dom Quixote, 1984
“É pelas canções populares que um país traduz mais lidimamente o seu carácter nacional e os seus costumes. A música, a necessidade de cantar, de dizer alto a sua alegria aos homens e às coisas, é uma questão de latitude, uma questão de sol. Quanto mais para o sul, mais se ouve cantar.” É assim que começa a História do Fado de Pinto de Carvalho (Tinop), publicada pela primeira vez há quase cem anos e que permanece como uma das mais sólidas referências bibliográficas sobre o género que foi imortalizado pela Severa, Amália e Marceneiro.
Defensor da origem marítima do fado, Tinop recusa em absoluto a raiz árabe que Teófilo Braga lhe atribui. E justifica-se com factos, afirmando que, se assim fosse, “o fado, pela sua diuturna existência, ter-se-ia espalhado por todo o país, ao passo que só modernissimamente chegou ao Porto e se canta nas duas Beiras”. E também existiria no Algarve e no sul de Espanha, nos lugares onde a cultura árabe permaneceu por mais tempo na Península Ibérica – acrescenta.
Para este autor, o fado surge como a consequência de uma expressão musical com origem marinheira, mescla das “toadas plangentes” de que falava Oliveira Martins, “cantigas monótonas como o ruído do mar”, que se ouviam “por toda a costa do ocidente”. Só em 1840 aparece referenciado em Lisboa: “Até então, o único fado que existia era o fado do marinheiro, cantava-se à proa das embarcações, onde andava de mistura com as cantigas de levantar ferro, a canção do degredado e outras cantilenas undívagas”, diz Pinto de Carvalho.
Um documento que se mantém actual e válido, e que está na origem de todos os mais sérios estudos sobre o género que se escreveram nos últimos anos, desde A MITOLOGIA FADISTA de António OSÓRIO aos ensaios de Rui Viera Nery, passando até pelas entrevistas de Baptista BASTOS que integram a História do fado publicada pelo Ediclube em 1999.
Mário CORREIA
Mário CORREIA
Música Popular Portuguesa - Um ponto de partida
Edição Centelha/Mundo da Canção, Coimbra-Porto, 1984
Foi a primeira abordagem à história da Música Popular Portuguesa, tema que o autor acompanha de perto desde há três dezenas de anos, nomeadamente através da revista Mundo da Canção, de que era o director na altura em que este livro foi publicado. “Um ponto de partida”, como honestamente se assumiu este livro de Mário Correia, um pretexto para novas abordagens, novas histórias de uma memória ainda em construção. Naturalmente datado, o testemunho de Mário Correia permanece, ainda assim, uma referência obrigatória para todos os estudiosos da nossa música popular: desde o tempo das “baladas” – e mesmo antes dele, através das “heróicas” de Fernando Lopes-Graça – este livro traça o percurso de um movimento que haveria de desembocar, à data da feitura deste livro, no referencial Por Este Rio Acima, de Fausto.
Integrando uma das mais completas discografias da MPP alguma vez editadas, o livro traça as diversas fases de um movimento que, diga-se em abono da verdade, passou sempre mais por um conjunto de acções artísticas mais ou menos isoladas do que pelo esforço comum dos seus diversos criadores – mesmo se, antes do 25 de Abril, existia uma estratégia mais ou menos comum de actuação.
Está cá tudo? Certamente que não, nem esse terá sido o objectivo de Mário Correia. A intenção passava por disponibilizar a informação possível sobre um movimento cultural que, na altura, dava ainda os primeiros passos. Assim, este livro adquiriu também uma importância insofismável como repositório de muita da documentação factual publicada nos jornais até então. E se nem tudo aconteceu como Mário Correia sugeria (o “trovantismo e o pós-trovantismo”, por exemplo, não deram em nada – a não ser que, com muito boa vontade, vejamos a Ala dos Namorados como “sucessora” da banda de Baile no Bosque), nem por isso este trabalho deixa de ser uma obra meritória. Até pelos caminhos que ajuda a desvendar, em primeira abordagem.
Com o seu Ponto de Partida esgotado há muito, Mário Correia pretende publicar brevemente uma nova edição, aumentada e corrigida de acordo com a evolução da MPP nas últimas duas décadas.
Mário CORREIA
Adriano Correia de Oliveira: Vida e obra
Editora Centelha, Coimbra, 1987
Cantar era uma das duas coisas que ele sabia fazer melhor. A outra era semear amigos, onde quer que estivesse. Chamava-se Adriano Correia de Oliveira, mas basta chamá-lo pelo nome próprio para saber de quem se fala – do Adriano, que outro poderia ser?
“Era o melhor de todos nós.” Fausto Bordalo Dias, um dos seus grandes amigos, definiu assim o Adriano. “Um operador da amizade”, como acrescentou Lopes de Almeida. A unanimidade dos que o conheceram como homem generoso e bom é tão grande como o silêncio que sobre ele se fez nos últimos anos. Um caso típico de ingratidão nacional? Tentativa consciente de calar a sua voz inigualável? Incompetência pura e simples do(s) poder(es) e demais entidades a quem cabe zelar pela preservação da cultura e da memória? Talvez seja um pouco de tudo isso. E no entanto, ele move-se. Existe ainda, porque ainda incomoda. Mas também porque a sua lembrança permanece forte e grata junto dos que tiveram o privilégio de o conhecer.
Adriano Correia de Oliveira – Vida e Obra, de Mário Correia, foi a primeira abordagem biográfica do intérprete de Canção com Lágrimas e Trova do Vento que Passa. Símbolo maior do espírito generoso que marcou o movimento renovador da música portuguesa dos anos 60 – em que participou, na primeira linha e desde o seu início, como voz privilegiada – o “bom gigante” não conseguiu escapar às malhas da intriga e do oportunismo em que se enredaram alguns dos seus pretensos amigos, após o 25 de Abril. E é assim que, em 1981, é expulso da cooperativa Cantarabril, de que foi fundador, perante a revolta impotente de alguns (Ary dos Santos, Carlos do Carmo, Carlos Paredes, Luís Cília, Manuel Branco) e o silêncio cúmplice de muitos. Serão estas e outras pequenas coisas, juntamente com a “normalização” social e política que se seguiu ao 25 de Novembro, que farão crescer nele um imenso desencanto, que tentava contrariar com um excessivo consumo de álcool, vindo a morrer, em Avintes, a meio da tarde de 16 de Outubro de 1982, nos braços da mãe. Tinha 40 anos.
O livro de Mário Correia sistematiza pela primeira vez as principais etapas da vida e da obra de Adriano. Um auxiliar precioso para a compreensão daquele que terá sido, porventura, a mais pura de todas as vozes da música popular portuguesa, recentemente complementado pelo precioso ADRIANO PRESENTE, de Manuel REIS.
Mário CORREIA
A música tradicional na obra de José Afonso
Cadernos de Música Popular Portuguesa I
Edição Câmara Municipal da Amadora, 1999
A riqueza da música tradicional portuguesa não foi coisa que passasse despercebida a José Afonso. Grande parte da sua lírica bebe directamente nas fontes da oralidade, seja nas primeiras canções, seja nos temas da maturidade. E, não raras vezes, Zeca utilizou o cancioneiro tradicional no seu estado “quase puro”. Desde o Vira de Coimbra a Senhora do Almortão, passando por S. Macaio, Minha mãe, Canta Camarada ou Maria Faia, não faltam os exemplos de composições tradicionais recriadas por Zeca Afonso nas suas músicas.
Mário Correia fez o levantamento da tradição de que Zeca se serviu e o resultado foi este caderninho (A música tradicional na obra de José Afonso) editado em 1999 pela Câmara da Amadora onde, para lá da análise do património tradicional de que José Afonso se serviu, se inclui uma pequena “antologia” de temas populares cantados por Zeca – onde se torna evidente a leitura que o cantor inevitavelmente fez de A CANÇÃO POPULAR PORTUGUESA, de Fernando Lopes-GRAÇA. Algumas desagradáveis pequenas gralhas, nomeadamente nas letras de algumas canções (“quem seria a capadeira” em vez de “quem seria a caiadeira”, na Moda do Entrudo, ou “mondadeiras do meu linho” em lugar de “mondadeiras do meu milho”, em Milho Verde, são dois exemplos), nem por isso fazem deste caderno um contributo menos interessante para a análise da obra de Zeca.
Mário CORREIA
Carlos Paredes: Uma guitarra em movimento perpétuo
Edição Sons da Terra, Vila Nova de Gaia, 2000
Na bibliografia da música popular, Carlos Paredes foi, durante anos, uma lacuna total: os parcos esboços da sua biografia andavam espalhados por algumas páginas de jornais e revistas, um ou outro programa de rádio, quase nada de televisão, os textos que acompanham os discos. Há as entrevistas, ainda assim bastantes, em que o mestre fala de si e dos outros. Há a gravação de alguns concertos, registando o diálogo que, para lá da guitarra, Paredes desde sempre fez questão de incentivar nas suas apresentações públicas.
No início do ano 2000, Mário Correia e Octávio Fonseca e SILVA deram os primeiros passos para o preenchimento desse outro silêncio a que Carlos Paredes parecia votado, respectivamente com Uma Guitarra em Movimento Perpétuo e A GUITARRA DE UM POVO, dois volumes editados exactamente no ano em que Paredes completou 75 anos de vida. No livro de Mário Correia, uma parte essencial da prosa respeita ao que se passou em 1984 no Teatro Carlos Alberto, do Porto, durante aquele que é referenciado como o primeiro “grande concerto” de Carlos Paredes em Portugal. Através da conversa que o músico estabeleceu com o público, Mário Correia expõe o perfil do artista e do homem, com a frontalidade serena que é característica do Mestre.
Refira-se, a propósito, que o espectáculo do Carlos Alberto encontra-se gravado e desse registo existe um duplo CD, que teve uma limitadíssima edição não comercial de 40 exemplares distribuídos a alguns jornalistas e amigos do músico por ocasião da apresentação pública de A GUITARRA DE UM POVO, durante o Festival Intercéltico de 2000.
Tal como a própria vida de Mestre Carlos, o livro de Mário Correia possui muitos mais pontos de partida que de chegada. Afinal, sobre o mago dos dedos de ouro, está ainda tanto por contar. Mas não será esse mesmo o fascínio maior de uma vida intensa e apaixonada como a de Carlos Paredes?
Elfriede ENGELMEYER
Elfriede ENGELMAYER
José Afonso, poeta
Edição Ulmeiro, Lisboa, 1999
Uma rara abordagem da arte poética de José Afonso, feita pela professora universitária que nos anos 80 dedicou a sua tese de doutoramento à obra do cantor português – posteriormente publicada pela editora da Universidade de Viena de Áustria com o título Utopie und Vergangenheit: Das Liedwerk des portugiesischen Sängers José Afonso (Utopia e passado: as canções do cantor português José Afosno, v. BIBLIOGRAFIA GERAL DA MPP).
Elfriede Engelmayer, que foi também a responsável pela organização das últimas edições de TEXTOS E CANÇÕES de José AFONSO, analisa neste estudo a produção de Zeca enquanto poeta – condição que certos académicos resistiram durante anos em reconhecer-lhe, por mais que nesse sentido se manifestassem desde sempre alguns dos mais importantes nomes das letras portuguesas, como o fizeram em diversas ocasiões Urbano Tavares Rodrigues, Bernardo Santareno, Fernando Assis Pacheco, Louzã Henriques, Manuel Alegre ou Manuel da Fonseca, para só citar alguns dos que cedo souberam reconheceram a poesia de José Afonso.
O pequeno volume é também uma excelente introdução literária à obra do compositor, onde a autora defende que “o poeta José Afonso vive na sombra de Zeca Afonso, cantor político” e procura levar o leitor a descobrir a dimensão total da poesia do autor de Vampiros.
Michel GIACOMETTI
Michel GIACOMETTI
Cancioneiro popular português
Ed. Círculo de Leitores, Lisboa, 1978; 2ª ed., 1981
Feito em colaboração com outro nome grande da música portuguesa, o maestro Fernando Lopes-Graça, o Cancioneiro popular português é, desde o seu lançamento, um marco histórico da musicologia nacional. “Talvez uma das mais significativas a nível internacional, em termos de recolha, inventariação e defesa de uma área fundamental do nosso património cultural popular” – assim foi escrito, com toda a justiça, em O Diário. Esta foi a obra prima de Giacometti – o corso apaixonado por Portugal e pela sua música, a quem ficaram a dever-se a recolha e o registo fonográfico do património musical popular que, nos anos 60, foi possível resgatar à normalização do SNI, contra a qual se insurgira, dez anos antes, Lopes-GRAÇA em A CANÇÃO POPULAR PORTUGUESA.
O livro de Giacometti (que reúne uma parcela significativa das suas investigações desde a sua chegada a Portugal, em 1959) foi a continuação lógica de todo o trabalho desenvolvido pelo musicólogo corso no nosso país, prolongando no tempo aquilo que ele próprio havia feito para diversas estações de rádio europeias (paradoxalmente, ou não, Giacometti nunca teve a oportunidade de elaborar um programa do género para as rádios do seu país adoptivo) e na série documental “Povo que canta”, que idealizou e realizou para a RTP, já depois do 25 de Abril.
A obra de Giacometti é a continuação, por escrito, da Antologia de Música Regional Portuguesa, que organizou com Lopes-Graça, e dos 24 discos que gravou para os Arquivos sonoros portugueses, consagrados à música tradicional portuguesa – e que são ainda das fontes documentais mais preciosas do nosso património cultural colectivo.
Sérgio GODINHO
Sérgio GODINHO
Canções de Sérgio Godinho
Edição Assírio & Alvim, Lisboa, 1977; 2ª edição, 1982
De então para cá, Sérgio Godinho já escreveu canções suficientes para outro livro, mas esta, mesmo para quem só tem a primeira edição, continua a ser uma obra de referência. Editado pela primeira vez em 1977, este livro inclui as canções inesquecíveis de Sérgio Godinho, mas o seu valor maior está talvez no exaustivo prefácio que Arnaldo Saraiva escreveu e que constitui provavelmente a mais aprofundada análise da obra do criador de O primeiro dia alguma vez feita. O registo adoptado pelo professor universitário é simultaneamente simples, sem deixar de ser erudito, afectivo, sem deixar de ser rigoroso, e acessível aos cidadãos comuns, sem deixar de ser um trabalho literário.
Uma das virtudes da música popular foi também permitir uma maior aproximação entre os vários universos que integram a vida intelectual portuguesa. Com este estudo, Arnaldo Saraiva avalizou a maioridade da Música Popular Portuguesa, através de um dos seus mais significativos intérpretes. Não que o reconhecimento, chamemos-lhe, académico seja necessariamente importante para o resultado final, mas trata-se de um acto de justiça – daqueles que, em Portugal, costumam acontecer já demasiado tarde. Não foi o caso, e ainda bem.
Fernando Lopes-GRAÇA
Fernando Lopes-GRAÇA
A canção popular portuguesa
Ed. Cosmos, Lisboa, 1953; 4ª edição, remodelada, Ed. Caminho, 1991
“Tal como certas formas do trajar ou do pentear, tal como certas cores, certos móveis, certas frases e até certas maneiras de falar e de andar, há palavras que, em determinado momento, caem na moda. ‘Folclore’ é uma dessas palavras. Até há relativamente pouco tempo era ela entre nós a bem dizer apenas conhecida e utilizada por uns tantos ‘maduros’, que se davam à coleccionação e estudo de umas quantas velharias, que a ninguém interessavam. (...) Por toda a parte se formam ‘ranchos folclóricos’, os fornecedores do repertório musical ligeiro inundam o mercado com os seus ‘arranjos folclóricos’, as vedetas da rádio brilham no ‘estilo folclórico’, os restaurantes anunciam os seus ‘pratos folclóricos’, há os trastes e adornos caseiros folclóricos – enfim, o folclore invadiu tudo, o folclore tornou-se uma tineta, uma doença, um modo de vida. (...) Cremos que vai sendo altura de reagir contra este uso e abuso do folclore, libertando-o de toda a casta de deturpações ilegítimas, e isto em todos os seus domínios.”
Assim começa A canção popular portuguesa, um sério estudo do maestro Fernando Lopes-Graça sobre a nossa música tradicional, que na altura (o livro foi escrito em 1953) se encontrava em plena fase de domesticação, de acordo com a política que havia sido definida, anos antes, por António Ferro, e que o Secretariado Nacional de Informação (SNI) se encarregava de pôr em prática. Lopes Graça estabelece os contornos daquilo que considera ser o “folclore autêntico” e denuncia a “contrafacção folclórica” que se praticava, caracteriza a “canção portuguesa” e determina “o valor estético e a significação nacional da canção popular portuguesa”.
A segunda parte deste livro, ainda hoje fundamental para o conhecimento profundo das raízes tradicionais da música portuguesa, integra uma antologia de temas tradicionais – desde os clássicos Vai-te embora ó papão e José embala o menino a temas que, nos nossos dias, foram popularizados por grupos como a Brigada Victor Jara, como O anel que tu me deste. Um trabalho que Graça viria a desenvolver em conjunto com o musicólogo corso Michel GIACOMETTI e que foi anos mais tarde utilizado por vários músicos, de José Afonso a Luís Cília, passando por todos os grupos de música tradicional surgidos após o 25 de Abril.
Leonor LAINS
Leonor LAINS
Amália Rodrigues
Edição Orabem, Lisboa, 2000
Em 25 de Abril de 1974, os jornalistas e os divulgadores mais exigentes perante a função social da música ainda escreviam depreciativamente “Dona Amália” de cada vez que se referiam à “cantora oficial do fascismo”, como era conhecida. Hoje, até isso já lhe foi perdoado e Amália repousa agora no Panteão Nacional, ao lado de Guerra Junqueiro e Alexandre Herculano. “Não foi uma cantora de regime, foi uma cantora de Portugal”, diz-se agora. E todos concordam.
Este livrinho de Leonor Lains é uma excelente síntese biográfica da nossa maior cantora e integra a colecção Vidas Lusófonas, dirigida por Fernando Correia da Silva, que já tem igualmente volumes dedicados a Pedro Álvares Cabral, D. João II, Eça e Camões. Trata-se de uma leitura concisa e factual dos principais momentos da vida da fadista que permite um melhor conhecimento da sua obra e das circunstâncias do seu tempo. A maturidade da democracia portuguesa permite-nos agora ver e ouvir Amália sem os complexos da pequena política, sempre de ordem circunstancial. Complexos que, porém, nunca os maiores da MPP manifestaram – e basta pensar na relação artística que existiu entre Amália e Carlos Paredes, por exemplo.
Por isso talvez não seja excessivo lembrar aqui o curto diálogo havido no único encontro entre Amália Rodrigues e José Afonso, que aconteceu no Clube dos Jornalistas, em Lisboa, a meados da década de 80, já a doença de Zeca se manifestara e era do conhecimento público. O jornalista Eugénio Alves apresentou os dois cantores, durante uma festa promovida pela colectividade. Pergunta Amália:
– Oh, Zeca, você acha que eu canto bem?
E Zeca, sereno:
– Se a senhora não canta bem, quem é que canta bem em Portugal?
José Jorge LETRIA
José Jorge LETRIA
A canção política em Portugal
Edição A Opinião, Porto, 1977; 2ª edição, Ulmeiro, Lisboa, 1999
Jornalista e músico, José Jorge Letria foi uma voz importante no início dos anos 70 e durante todo o processo revolucionário em Portugal. Dono de um particular sentido de humor, Letria recorreu com frequência à sátira, tornando-se, após o 25 de Abril, num dos mais activos cantores da área do PCP – de onde viria a sair após o “golpe de Agosto” na URSS, em 1990 – e as suas canções passaram a ter um tónica claramente política, sendo por vezes a transposição para música de palavras de ordem da época (casos de A vitória é difícil mas é nossa, Quem tem medo do comunismo? ou Só de punho erguido, por exemplo), num dos mais claros exemplos da canção de intervenção que se praticou entre 74 e 75.
Neste livro, José Jorge Letria traça uma panorâmica da canção política, desde os primórdios do movimento até ao PREC, fazendo o balanço dos momentos mais significativos de todo esse percurso de 15 anos. O prefácio de José Barata MOURA versa sobre o apregoado carácter “panfletário” da canção política de intervenção directa e é uma curiosa análise do papel que a canção desempenha nos momentos de maior agitação social. Um livro que é também um testemunho, já que o seu autor foi participante activo em todo esse movimento. E que, ainda hoje, ajuda a perceber melhor porque razão a cantiga foi uma arma tão importante ao serviço do Portugal de Abril.
José Jorge LETRIA
A canção como prática social
Edições Ró, Cacém, 1981
Lamentavelmente quase esquecido, este livro relata “algumas das mais significativas experiências de canto político, a nível mundial”. Woody Guthrie, Atahualpa Yupanki, Violeta Parra, Joe Hill, Pete Seeger, Victor Jara ou Miriam Makeba são alguns dos criadores de que José Jorge Letria traça o perfil, ao mesmo tempo que dá conta de experiências como a “nueva trova” cubana ou a “nova cançó” que nesses tempo se fazia ouvir na Catalunha e viaja até aos primórdios da canção política europeia, com Eugéne Pottier e Pierre Degeyter (os autores, respectivamente, da letra e da música de A Internacional) e com Aristide Bruant (1851-1925), o cantor francês que no século XIX reivindicou o direito a “gritar na cara dos ricos, dos satisfeitos, o desespero e a revolta dos sem-casa, dos sem-fogo, dos sem-pão, das vítimas das leis mal feitas e das iniquidades sociais”.
Com um interessante prefácio de Carlos Paredes (recuperado em 2000 para o livro CARLOS PAREDES – A GUITARRA DE UM POVO, de Octávio Fonseca SILVA), continua a ser uma referência bibliográfica para todos os que se interessam pela canção como forma de expressão e de intervenção política, a nível mundial.
José Barata MOURA
José Barata MOURA
Estética da canção política
Edição Livros Horizonte, Lisboa, 1977
Escrito numa perspectiva assumidamente marxista, este livro de José Barata Moura foi a primeira tentativa de sistematização dos pressupostos da estética da estética do canto de intervenção, tal como era entendida no período pós-revolucionário. Algumas das concepções defendidas no livro eram, já na altura, objecto de discussão – nomeadamente aquelas que mais tendem a aproximar a estética da canção política das formas neo-realistas. O produto final, escrito ao longo da primeira semana de Agosto de 1976, pretendia ser apenas um conjunto de reflexões sobre o tema, cuja candência era, então, inquestionável. Na realidade, acabou por ir muito mais longe e é, hoje, um bom instrumento de análise sobre um género musical que fez história em Portugal e no mundo.
José Viale MOUTINHO
José Viale MOUTINHO
O nosso amargo cancioneiro
Edição Livraria Paisagem, Porto, 1972; 2ª edição: 1973
Foi a primeira antologia do movimento cantigueiro dos anos 60-70, com duas edições esgotadas em pouco tempo. Reúne 111 canções de 21 intérpretes, a saber: Adriano Correia de Oliveira, António Bernardino, Ana Maria Teodósio, Carlos Mendes, Denis Cintra, Filarmónica Fraude, Francisco Fanhais, Hugo Maia de Loureiro, José Afonso, José Jorge Letria, José Mário Branco, Luís Cília, Manuel Freire, Irmã Maria Humberta, Nuno Filipe, Quarteto 1111, Rita Olivaes, Rui Silva, Samuel, Sérgio Godinho e Vieira da Silva. Na altura do seu lançamento, este livro de José Viale Moutinho tornou-se rapidamente no principal guia de referência para todos os que se envolviam, directamente ou não, no movimento musical emergente. Juntamente com a revista Mundo da Canção (de que Viale Moutinho foi director durante algum tempo), O nosso amargo cancioneiro foi provavelmente a melhor contribuição para a divulgação da música que, se não mudou o mundo, ajudou claramente a mudar Portugal. Um ano após a primeira edição deste livro, Viale Moutinho publicou o ensaio-antologia José Afonso (v. BIBLIOGRAFIA GERAL DA MPP), que também teve uma edição espanhola, de grande êxito, em 1975.
José Viale MOUTINHO
Cancioneiro de Abril
Edição Ulmeiro, Lisboa, 1999
Editado nas comemorações do 25º aniversário da Revolução dos Cravos, este Cancioneiro de Abril assume-se como “o revisitar dos textos que serviram de base a algumas das melhores cantigas portuguesas”, como afirma o seu autor na nota introdutória. Dedicada “à memória de Adriano Correia de Oliveira, por tudo quanto lhe devemos”, mas também a Carlos do Carmo, José Niza, Manuel Freire e Arnaldo Trindade (a quem era também dedicado O NOSSO AMARGO CANCIONEIRO, juntamente com Avelino Tavares, Francisco Almazán e Manuel Vásquez Montalbán), esta antologia reúne excertos de entrevistas dos principais protagonistas do canto de intervenção e 152 canções de 24 cantores (Adriano Correia de Oliveira, António Bernardino, António Macedo, Denis Cintra, Ermelinda Duarte, Fausto, Fernando Tordo, Francisco Fanhais, Janita Salomé, José Afonso, José Barata Moura, José Jorge Letria, José Mário Branco, Luís Cília, Luísa Basto, Manuel Freire, Paulo de Carvalho, Pedro Barroso, Rita Olivaes, Samuel, Sérgio Godinho, Tino Flores, Vieira da Silva e Vitorino) além de um interessante posfácio de António Balcão Vicente.
Estruturalmente, este Cancioneiro de Abril é semelhante, de alguma forma, ao livro Memória do canto livre em Portugal (v. BIBLIOGRAFIA GERAL DA MPP), que o mesmo Viale Moutinho publicou em 1975. Inevitavelmente, algumas canções – a maioria – encontram-se em ambas as antologias, qualquer delas excelente meio de documentação sobre os momentos mais agitados, mais autênticos e mais nobres da história da música popular portuguesa.
Ernesto Veiga de OLIVEIRA
Ernesto Veiga de OLIVEIRA
Instrumentos musicais populares portugueses
Ed. Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1966; 3ª ed., 2000
Para Júlio Pereira, este foi o livro que o levou à descoberta do cavaquinho e, depois, de um sem número de instrumentos populares que incorporou de forma única na sua música, transformando-se no homem dos sete instrumentos a quem se devem tantos momentos musicais únicos, em discos próprios ou em gravações alheias – com destaque para as muitas e muito cuidadas participações em registos de José Afonso.
Através de um trabalho exaustivo de pesquisa, investigação e reconstrução, o etnólogo Ernesto Veiga de Oliveira fez um inventário rigoroso dos instrumentos musicais populares que é possível encontrar no nosso país. Um trabalho que nos leva à descoberta instrumentos que produzem sons antigos, muitos deles já esquecidos, e que constituem uma parte importante da nossa identidade.A terceira edição deste livro, revista e aumentada, aconteceu em 2000 por iniciativa conjunta da Fundação Gulbenkian e do Museu de Etnologia, com direcção editorial de Benjamim Pereira. Uma obra de primeiro plano e também uma referência indispensável de um autor a quem se devem outras obras de grande qualidade, como Festividades cíclicas em Portugal ou Instrumentos populares dos Açores (v. BIBLIOGRAFIA GERAL DA MPP).
António OSÓRIO
António OSÓRIO
A mitologia fadista
Ed. Livros Horizonte, Lisboa, 1974
É provavelmente a mais importante análise sociológica do fado e das condições em que se desenvolveu a sua mitologia. Partindo das raízes do género, António Osório traça uma perspectiva muito lúcida do que foi a sua evolução, as lendas que nele se incorporaram, os objectivos que serviu em diversas fases da sua história. Porque nem sempre a canção popular de Lisboa foi o “malfadado fado” de que falava com desprezo o maestro Fernando Lopes-GRAÇA. E é todo esse percurso, observado em pormenor por António Osório, que este livro acompanha com rigor histórico e espírito crítico quanto baste. Fundamental para perceber um pouco mais como se faz a história, ainda que marcado por um claro preconceito ideológico (o livro foi publicado em 1974, não nos esqueçamos) que se manifesta ao longo de muitas passagens do livro e prejudica a análise daquilo que efectivamente é essencial.
Eduardo M. RAPOSO
Eduardo M. RAPOSO
Canto de intervenção
Ed. Museu da República e Resistência, Lisboa, 2000
O livro de Eduardo M. Raposo sobre o “canto de intervenção”, apesar do estatuto com que se apresenta perante os leitores (afinal trata-se de um trabalho decorrente da tese de mestrado do autor, identificado na contracapa como “Mestre em História do Século XX”), perde-se numa tentativa de sistematização de factos e ideias, acabando por resultar numa simples recolha de depoimentos e documentos, sem dúvida interessantes e que podem ser um contributo de mérito para a história da canção de resistência – mas não são ainda essa história.
Este estudo está elaborado a partir de uma confusão primária, expressa logo no título: Canto de Intervenção 1960 – 1974. Impõe o rigor que se diga que a “canção de intervenção” só surge em Portugal após a revolução, deixando atrás de si a “canção de protesto” ou “canção de resistência”, fruto do chamado “movimento dos baladeiros”. O primeiro a referir-se-lhe nestes termos foi José Afonso, numa mesa redonda para o jornal Página Um, em 1974, no que ficou como uma implícita diferenciação do canto livre idealizado por alguns cantores próximos do Partido Comunista Português.
Mas vamos admitir que este seja um problema menor. Um livro desta suposta envergadura não pode dedicar a Francisco Naia, com todo o respeito que o seu nome e a sua obra legitimamente nos merecem, o mesmo destaque que dá a Manuel Freire e, depois, ignorar ou passar de raspão por gente como Denis Cintra, Rita Olivaes, António Macedo, Duarte & Ciríaco, Vieira da Silva, Carlos Alberto Moniz, Maria do Amparo, Teresa Paula Brito, António Pedro Braga, Fausto, Filarmónica Fraude, José Cid, Samuel. Ou Carlos Paredes que, talvez por apenas fazer música, não foi considerado por Eduardo Raposo, apesar de o mestre da guitarra ser tão importante neste movimento renovador como Adriano ou Zeca Afonso.
Apesar das intenções expressas, Canto de Intervenção fica muito aquém daquele que deveria ser o objectivo central do seu autor: historiografar, de forma rigorosa, um dos movimentos mais ricos e mais criativos da música portuguesa contemporânea. Em vez disso, não consegue mais do que alinhavar alguns elementos que, algum dia, talvez possam ser úteis como apontamentos avulsos para qualquer estudioso sério, mestre ou discípulo, que deseje traçar, enfim, uma perspectiva histórica dos primórdios da música popular portuguesa. Resta, assim, fazer justiça ao excelente prefácio de João Paulo Guerra, onde se traça uma perspectiva sucinta do movimento, com o rigor que infelizmente falta ao resto do livro.
Eduardo M. RAPOSO
Cantores de Abril - Entrevistas a cantores e outros protagonistas do ‘canto de intervenção’
Edições Colibri, Lisboa, 2000
O segundo livro de Eduardo M. Raposo dedicado à música popular portuguesa, este volume sobre os Cantores de Abril, tem sobre o primeiro a vantagem de querer ser apenas aquilo que é – e que o autor assume logo no início, em subtítulo: um livro de entrevistas a cantores e outros protagonistas do ‘canto de intervenção’.
Aqui reúne Eduardo M. Raposo os testemunhos recolhidos para elaborar o anterior CANTO DE INTERVENÇÃO 1960-1974. Valem pelo mérito próprio de quem os fez, não tanto enquanto entrevistas em si. E é pena, também, que a língua portuguesa não seja mais respeitada ao longo destas 220 páginas, onde está por vezes sujeita a autênticos tratos de polé – quando, afinal, uma das características dos movimentos que desaguaram na moderna música popular foi sempre a utilização inventiva e criteriosa do idioma que nos ensinaram os nossos pais e queremos transmitir aos nossos filhos.
Apesar de tudo, o livro vale pelos depoimentos que inclui. Fica o documento e, acreditamos, a boa vontade de Eduardo Raposo. Que, como se sabe, não chega para fazer história – quanto mais para a escrever.
Manuel REIS
Manuel REIS
Adriano, presente
Editora Ausência, V. N. Gaia, 1999
“Mesmo na noite mais triste / em tempo de servidão / há sempre alguém que resiste / há sempre alguém que diz não.” Estes versos simples e directos que encerram a Trova do Vento que Passa e a tornaram num dos hinos mais emblemáticos da resistência antifascista nasceram, ironicamente, graças... à Pide. Foi o próprio Manuel Alegre quem o revelou num programa evocativo do 25 de Abril, “A Cantiga é uma Arma”, produzido e transmitido pela RTP, em 1997, a partir do Largo do Carmo: “Um dia, vinha eu a atravessar a Praça da República em Coimbra na companhia do Adriano, seguido como habitualmente por dois agentes da polícia política, e de repente apareceram-me como um grito de revolta os últimos quatro versos da Trova do Vento que Passa. Disse os versos ao Adriano e ele ficou entusiasmado e incitou-me a escrever o poema”.
Esta é uma das histórias que se recordam em Adriano, Presente, o título da mais recente e mais completa biografia de Adriano Correia de Oliveira. Um livro que já tardava, graças ao qual o leitor acede a alguns recantos do mundo de Adriano: a sua querença, a sua luta, a sua fragilidade – tudo isto, estas e outras múltiplas partes de que era feito o “bom gigante” das cantigas, se pode encontrar nas páginas deste livro de Manuel Reis.
Um livro sobre Adriano, o segundo. Antes de Manuel Reis apenas Mário CORREIA arriscara traçar um perfil biográfico da mais clara das vozes que cantaram a nossa liberdade. Fê-lo em 1987, no volume ADRIANO CORREIA DE OLIVEIRA: VIDA E OBRA, o primeiro livro sobre o intérprete de Canção com lágrimas, que recolhe um conjunto de referências biográficas e musicais de primeira linha para traçar o perfil da sua vida e da sua obra, uma e outra nem sempre lineares.
Num tempo de silêncios como aquele em que vivemos, a edição de uma fotobiografia como este Adriano, Presente – para mais bastante cuidada, gráfica e editorialmente – é naturalmente de saudar. Para mais, inclui uma muito completa documentação fotográfica das diversas fases da vida de Adriano e algumas curiosidades que haveriam de aguçar o seu impagável sentido de humor. Veja-se, por exemplo, a involuntária ironia da reprodução do diploma da Ordem da Liberdade que lhe foi atribuída, onde pode ler-se “o direito a usar as insígnias” da condecoração – concedida a título póstumo...
Este livro ajuda-nos a compreender Adriano, mas dá sobretudo vontade de voltar a ouvi-lo. E de recordá-lo, sempre, grande e generoso e despojado como só os mais puros sabem ser. Isso é o mais importante, por ser talvez essa a única certeza que legou aos que o partilharam. Em forma de poesia, com palavras emprestadas por Manuel Alegre, seu parceiro e cúmplice: “Pode ser uma ilha ou uma prisão / em qualquer lado eu estou presente / tomo o navio da canção / e vou direito ao coração de toda a gente”.
José A. SALVADOR
José A. SALVADOR
José Afonso, o rosto da Utopia
Ed. Terramar, Lisboa, 1994; 2ª ed.: Afrontamento, Porto, 1999
Em 1984, José A. Salvador publicou Livra-te do medo: estórias e andanças do Zeca Afonso, resultado da compilação de um conjunto de entrevistas com o cantor realizadas entre 1976 e 1983. Foi o primeiro trabalho de grande fôlego sobre a obra do autor de Grândola Vila Morena e, pelo manifesto interesse do tema, resistiu até ao desastroso grafismo e aos acabamentos técnicos de quinta categoria, da responsabilidade da editora.
Dez anos depois, José A. Salvador decidiu revisitar todo o material que utilizara para o primeiro livro e, desta vez com o recurso a um excelente espólio fotográfico, surgiu este O rosto da Utopia, um volume de luxo que viria a ser reeditado, com novas fotos e grafismo renovado, em 1999. Trata-se de uma belíssima biografia de José Afonso, que surge quase sempre no discurso directo. Uma cronologia histórica permite ao leitor situar a vida e a obra de Zeca no contexto do seu tempo.
Sem se deixar prender aos “limites estritos do jornalismo”, tal como deseja o seu autor, o livro cumpre plenamente os objectivos a que se propõe: ser “um reavivar da memória e de memórias que espero inspire também os filhos da madrugada a (re)conhecerem José Afonso como homem, como poeta, como músico e como cantor”.
Vítor Pavão dos SANTOS
Vítor Pavão dos SANTOS
Amália: uma biografia
Editora Contexto, Lisboa, 1987
Quase década e meia sobre a sua primeira publicação, o livro de Vítor Pavão dos Santos continua a ser mais do que uma biografia, como modestamente se assume no título. Na realidade, esta é a biografia mais completa e mais rigorosa de Amália Rodrigues que jamais se publicou. Apaixonado pela arte da diva desde que, miúdo, a viu cantar pela primeira vez, ao lado do pai, José André, Vítor Pavão dos Santos é um investigador minucioso e que prima pelo rigor das fontes. É assim que esta longa entrevista com Amália se torna um marco impossível de ignorar. Reunindo peças como se de um imenso puzzle se tratasse, o livro de Vítor Pavão dos Santos reconstrói os passos da vida da cantora, desde a sua infância pobre até às tentações de suicídio, quando pensou que tinha uma doença incurável – e foi salva pelos filmes de Bing Crosby, que lhe devolveram a ideia de que vale a pena estar vivo. À semelhança dos outros trabalhos de Pavão dos Santos, nomeadamente o seu estudo sobre a revista à portuguesa e a sua entrega ilimitada ao Museu do Teatro, de que foi o fundador, esta biografia de Amália permanece como um documento único e que seria imperdoável desconhecer, sobretudo por parte de quem deseja conhecer um pouco da intimidade da cantora. Aqui contada com descrição e rigor, como só o Vítor Pavão dos Santos sabe fazer.
António dos Santos e SILVA
António dos Santos e SILVA
Zeca Afonso antes do mito
Edição Minerva, Coimbra, 2000
Testemunho dos anos do liceu de José Afonso, traçado aqui por um dos seus antigos companheiros de escola e de Coimbra, António dos Santos e Silva. Memórias da juventude, dispersas pelas mais de 100 páginas do livro, onde se reúnem histórias pouco conhecidas – ou mesmo desconhecidas de todo – de quando José Afonso estava ainda longe de ser o criador revolucionário em que se tornou. Entre lembranças ternas e episódios anedóticos, emerge do livro a profunda humanidade de Zeca, miúdo travesso e adolescente dono de um sentido de humor impagável, que o cantor nunca deixou de praticar – e a sua música está cheia de exemplos disso mesmo.
Um livro que já ocupa um lugar único na bibliografia passiva de José Afonso e que será de consulta obrigatória para qualquer trabalho futuro sobre o mais representativo cantor português da segunda metade do século XX. Por tudo o que nele se diz, mas também por tudo aquilo que a partir dele se torna possível descobrir.
Octávio Fonseca e SILVA
Octávio Fonseca SILVA
Carlos Paredes: a guitarra de um povo
Edição Mundo da Canção – Discantus, Porto, 2000
Com este volume dedicado à vida e à obra do nosso maior guitarrista, teve início a colecção “Biografias MC”, uma série de pequenos livros dirigida por Avelino Tavares – o fundador da histórica revista Mundo da Canção que se publicou no Porto entre finais dos anos 60 e meados da década de 80 e, a par de publicações como Memória do Elefante ou Musicalíssimo (v. BIBLIOGRAFIA GERAL DA MPP), teve um papel fundamental na divulgação da melhor música portuguesa.
Juntamente com UMA GUITARRA EM MOVIMENTO PERPÉTUO, de Mário CORREIA, o livro de Octávio Fonseca Silva dá-nos um primeiro e valioso contributo para a escrita da “história” do mais genial dos nossos músicos. Tarefa complicada, já se sabe, que “o filho do Rei Artur” (como lhe chamou Fernando Assis Pacheco) é homem de muitas histórias, tantas quantas as muitas vidas que aceitou viver: desde a prisão, durante um ano e meio, nos cárceres fascistas às alegrias sem fim da Revolução dos Cravos, desde o tempo em que foi expulso da função pública por gostar demasiado dos outros até à consagração nos grandes palcos do mundo que lhe deu a conhecer mais e mais Amigos, muita gente, tanta gente.
Música Popular Portuguesa: Uma bibliografia
Ed. CMA 2001