«Enxertos da cabeça de macacos no corpo de outros macacos, realizadas com êxito numa universidade norte-americana, poderão um dia dar origem a uma espécie de transplantações de corpo inteiro em seres humanos.»
A notícia, que acabei de transcrever ipsis-verbis, foi manchete no «Público» de anteontem e está a causar uma compreensível agitação entre os cientistas de todo o mundo. A partir de agora, pelo menos em teoria, passa a ser possível que alguém, sofrendo de uma doença incurável mas que tenha o cérebro em bom estado, receba o corpo de uma pessoa em situação de morte cerebral.
É aquilo a que os médicos chamam o «transplante radical» ou «transplante de corpo inteiro» e que, a ser um dia aplicado em seres humanos, permitirá a um cidadão - ou, melhor dizendo, à sua massa cinzenta - viver muito para lá dos limites actuais.
Ao contrário do que possa pensar-se, nenhum elemento da GNR de Sacavém pertence ao grupo de cientistas envolvidos nesta investigação. De resto, todos eles – os cientistas claro – se mostraram até ao momento muito interessados em não perder a cabeça com o bom sucesso das experiências já realizadas.
Dirão os mais pessimistas que esta técnica irá fatalmente dar origem a novos frankensteins, criaturas de um nada admirável mundo novo.
Mas a verdade é que, uma vez resolvido o problema de se saber quem é quem após a operação, o «transplante radical» poderá ter resultados muito interessantes.
Claro que há incompatibilidades. Não estou a ver, por exemplo, o cérebro de Artur Jorge em amena convivência com a musculatura de Sá Pinto, tal como duvido que houvesse corpo no Benfica ou no Sporting que resistisse à cabeça de Pinto da Costa. Mas, de um modo geral, julgo que a experiência será francamente positiva.
Imagino quão diferente seria o nosso parlamento se, um dia destes, Manuela Ferreira Leite aparecesse com o corpo de Cláudia Schiffer e Marques Mendes pudesse usufruir do body building de Silvester Stallone. E não duvido de que a presença de Portugal na NATO teria um outro significado se António Vitorino trocasse de corpinho com Schwarzeneger ou mesmo com Schwazkopf.
De igual modo, grandes cabeças, como as de Pacheco Pereira ou Pina Moura, ficariam certamente a ganhar se pudessem desfrutar de tronco e membros semelhantes aos de Isabel Mota ou Edite Estrela.
Finalmente, creio que um transplante radical seria muito útil ao general Carlos Azeredo, muito embora os riscos fossem, neste caso, bastante maiores: é que, além do corpo propriamente dito, os médicos poderiam concluir que era necessário mudar também de cérebro – e ainda lhe calhava o de algum judeu.
TSF | 5.Nov.1997