Talvez acossado pelas declarações de Miguel Sousa Tavares, que o acusou de não ser “um partido ambientalista, mas um partido animalista”, o PAN decidiu fazer prova de vida ambiental e avançou com uma proposta de lei para punir com pesadas multas quem atira pontas de cigarro à rua.
Como era de se esperar, a proposta de André Silva foi aprovada com os votos favoráveis do PS, do BE, do PEV e, claro, do partido proponente. O PCP e o PSD abstiveram-se, tal como fizeram cinco dos 18 deputados do CDS.
Acontece que, mais do que uma questão legal, deitar beatas à rua é (deveria ser) acima de tudo uma questão educacional. Exactamente como cuspir para o chão ou levar os cães a defecar impunemente na via pública. Mas, em vez de apostar seriamente em acções concretas de esclarecimento e sensibilização do povo em geral e dos fumadores em particular para o problema (real) que representam as de pontas de cigarros descartadas no meio ambiente, o PAN optou pela via mais fácil da punição.
Ora sucede que, sendo este um problema de educação (ou falta dela) facilmente se percebe que serão, uma vez mais, os menos esclarecidos os principais visados pelas medidas repressivas previstas na nova lei. E, muito embora este seja um problema transversal a todas as classes sociais, serão naturalmente os mais pobres quem mais irá sofrer os seus efeitos.
Por outro lado, em todas as cidades, vilas e aldeias de Portugal são pouquíssimos os recipientes para lixo público disponíveis, e menos ainda os que estão preparados para recolher beatas. A solução para isto passa, segundo o PAN, por obrigar os estabelecimentos comerciais, nomeadamente os cafés e restaurantes, a terem cinzeiros à porta. Parece-me bem, mas é curto e está longe de resolver o problema de fundo, nomeadamente nas zonas residenciais e de lazer.
Resta saber como pretende o PAN levar à prática a política punitiva que propõe. Ou põe um polícia atrás de cada fumador, ou ressuscita os fiscais-de-isqueiros do tempo de Salazar ou, como com certeza vai acontecer, esta será mais uma lei politicamente correcta que não terá qualquer efeito em termos práticos. Exactamente como já sucede com os diplomas legais que obrigam os donos dos cães a recolher as respectivas cacas da via pública ou proíbem dar de comer aos pombos: é proibido, mas ninguém é punido, salvo se denunciado por terceiros.
E será talvez apenas neste caso que a lei poderá eventualmente ter alguma eficácia: afinal, o país continua cheio de gente a quem, como dizia Nuno Brederode Santos, a história negou a possibilidade de fazer carreira como informadores da PIDE. Quem sabe não terão agora, enfim, uma segunda oportunidade.
Aventar, 16.Jun.2019