...e passa tanto tempo num minuto
Fernando Assis Pacheco
Blá
E era na tarde um fogo igual
a tantos de tantos mais um jogo
final de que afinal ninguém sabia.
Era uma tarde um fogo que arde
sem saber se animal se dono
hão-de vencer um rogo alarve um grito.
Ou então era saudade o que esperavas
conta-me histórias conta-me as cidades
se era verdade ou assim mesmo
nada mais.
Blá blá
Assim fazer: como dizer
a festa o riso o desespero
o desemprego o outro dia
um outro poema inacabado
Assim dizer: como fazer
o reencontro o dia claro a madrugada
oblíqua a neblina que faz parte da paisagem
e o outro
à esquina das certezas
na margem da realidade.
Blá blá blá
(Intervalo para reclames) modelo prima Vera Verão
ou Toni Inverno para quem gosta de si. Sexo ao vivo
virtual (melhor o artesanal) self-service em copo com muito gelo
e um degelo – pecado! – Santa Maria Gasolina do deserto
nos dai hoje. Modess aderente é superconfortável. E o meu
namorado nem sequer nota que estou
com o período. Namorado
distraído,
não?
Blá blá blá blá
Notícia no semanal: ministro caga
num pé (e vem noutro) ele explica: seim cagou
por decência nacional assim convencido de
que o seu cu só fragueava
de modo fragrancial.
A oposição interroga-se: deve ministro ministrar
na hora de defecar? As notícias todas
às vinte horas.
Blá blá blá blá blá
E assim diriam: olha lá vai mais um
que marchou foi discreto
cumpridor do rame-rame não gritava
só de vez em quando paria uns monólogos
incompreensíveis conjuntos de frases con-
ciliadoras e distantes. Lá vai
– dirão – que outra sorte lhe não coube
e abençoado foi um bom pai razoável
chefe de família cumpridor do treme-treme
não gritava.
Ílhavo-Lisboa, 1992-93