Uma recente sondagem encomendada pela SIC e pelo Tal e Qual demonstrou que a esmagadora maioria dos portugueses considera que a prostituição deveria ser legalizada. Estarão os brandos bons costumes lusitanos em irremediavel processo de dissolução, ou será este apenas um primeiro sinal da nossa integração no pelotão da frente da União Europeia?
Na verdade, nem uma coisa nem outra, como se prova numa análise mais minuciosa da referida sondagem. Para 75% dos portugueses e 53% das portuguesas, as razões fundamentais de uma possível legalização do comércio sexual prendem-se com «motivos de saúde, controlo» e «moralização» social. Acrescente-se que três quartos dos inquiridos favoráveis se afirmaram católicos e os mais acérrimos defensores da medida são os votantes do PP, onde a percentagem de «sins» atinge os 83%.
Acho bem. Sobretudo pela moralização. Porque a verdade é que os portugueses não gostam de ver as meninas a atacar na Avenida, sobretudo quando vão acompanhados pelas respectivas esposas e se deixam traír por um olhar de esguelha lançado à Marlene ou à Carla Sofia. Sempre é mais cómodo encontrá-las no recato de um aparente lar, a salvo destas e de outras situações embaraçosas.
Mas a legalização da chamada «mais velha profissão do mundo» pode ter outros benefícios. O seu reconhecimento, mais do que justo, como uma actividade produtiva poderá ser o impulso que faltava para que a economia portuguesa se coloque em pé de igualdade com as suas congéneres europeias.
Claro que alguns problemas existem e não serão fáceis de resolver. Por exemplo, a fiscalização dos bordéis: será feita «in loco» ou por simples controlo burocrático? E quem vai tomar a seu cargo uma tão cristã responsabilidade? Haverá, em Portugal, quantidade suficiente de técnicos habilitados para tal fim?
Outro problema é o dos recibos verdes. Deverão as actividades sexuais estar sujeitas a IVA ou, tendo em conta a sua função social, deverão ficar isentas, tal como os médicos, os músicos, os escritores e os advogados? Deverá ser-lhes aplicada a taxa normal de IRS ou a taxa reduzida que contempla os produtos de primeira necessidade, como o pão, o leite e os livros? Ou, em vez de IRS, não será melhor colocar as profissionais do prazer na alçada do IRC - Imposto sobre o Rendimento Corporal?
São algumjas questões pertinentes, para que certamente o governo e os sindicatos, mais dia menos dia, hão-de encontrar resposta. Uma das medidas possíveis é, por exemplo, a obrigatoriedade de todas as casas de passe aderirem à prática do chamado CCB: refiro-me ao Contrato Colectivo de Bordel, instrumento fundamental gerir as relações de trabalho nesta área.
Porque a prostituição é, sem dúvida, uma actividade moderna, competitiva e de futuro. E, se é certo que já se vende sexo por telemóvel, para que as profissionais portuguesas possam concorrer de igual para igual com a crescente invasão de meretrizes de todos os pontos do globo impõe-se a rápida modernização do sector.
Os bordéis legais colocarão a meretriz profissional ao nível de qualquer técnico de informática, treinador de futebol, pedreiro livre, guarda-republicano ou jornalista de investigação. Os tansos de ontem, são os consumidores de amanhã. E «esfolar um cabrito» deixará de ser uma acção espontânea, para passar a ter em conta a análise prévia do mercado.
Aqui, assume grande importância a questão final - «last but not least» - da formação profissional. Mais do que qualquer outro, este é por excelência um negócio personalizado. E, ao contrário do que poderão pensar os já citados 83 por cento de votantes do PP, apesar de antigo, este ofício não se exerceu sempre da mesma maneira. Atrevo-me, por isso, a sugerir ao governo que disponibilize uma parte dos fundos de coesão para acções de formação e cursos de reciclagem das prostitutas portuguesas. De preferência já no próximo Orçamento Geral do Estado.
TSF | 17.Set.1997