O ataque terrorista de que foi alvo o ministro António Costa, há menos de oito dias, passou à margem das grandes discussões políticas que marcaram a última semana. Entretidos a distribuir referendos como se dessem milho aos pombos, o Conselho de Ministros, a Assembleia da República e restantes forças mais ou menos vivas do país não ligaram nenhuma ao sucedido durante a visita de António Costa a Guimarães, onde o ministro dos Assuntos Parlamentares foi agredido com uma posta de bacalhau demolhado.
Apesar de noticiado como um vulgar «fait divers», o ataque a António Costa veio provar aos mais incrédulos que Portugal não é um lugar invulnerável à prática desta nova espécie de terrorismo de rosto humano.
Antes de António Costa, os terroristas gastronómicos atacaram Bill Gates, o polémico patrão da Microsoft - dessa vez com uma vulgar tarte de natas, como nos filmes. O atentado contra o nosso ministro, no entanto, demonstrou que esta subversão de novo tipo consegue adaptar-se facilmente às características específicas de cada lugar. Note-se que António Costa não foi bombardeado com um fiel amigo qualquer, mas sim com "uma posta de bacalhau demolhado", muito provavelmente da Noruega.
Se o SIS não conseguir actuar a tempo, é natural que estas situações venham a repetir-se. Assim, não me admiraria nada que, um dia destes, o ministro Gomes da Silva fosse atacado com mioleira de vaca ou que alguém se lembrasse de bombardear Edite Estrela com uma dúzia de queijadas de Sintra.
O cozido à portuguesa deverá ser usado apenas para ataques massivos contra a classe política, mas as alheiras de Mirandela serão certamente uma boa arma de arremesso contra o ultra-transmontano Duarte Lima, do mesmo modo que, se alguém quiser atingir Macário Correia utilizará um bom repolho algarvio.
Odete Santos não poderá aspirar a mais do que a uma agressão com papas de sarrabulho ou carapauzinhos com açorda - alentejana, evidentemente. Mas Carlos Carvalhas, por uma questão regional e de estatuto, sempre poderá ser atacado com uma dose de vitela de Lafões. Menos sorte terá Manuel Monteiro, que dificilmente conseguirá mais do que levar em cima com um par de hamburgueres e duas latas de coca-cola.
É que os novos terroristas de faca e garfo usam as suas armas de acordo com as fragilidades das vítimas. Assim, num ataque contra o Cónego Melo é provável que utilizem um arsenal de papos d'anjo, orelhas de abade e toucinho do céu. Mas se o alvo for Marcelo Rebelo de Sousa, bastarão uns cinco ou seis jesuítas. Já o dialogante António Guterres poderá ser agredido com qualquer espécie de doce conventual, o que seria tão eficaz como atacar a Irmã Lúcia com um quarto de quilo de barrigas de freira.
Tudo isto, claro, no caso de os terroristas terem como alvo o poder político ou religioso. Porque, contra os banqueiros, grandes empresários e demais representantes do poder económico, a arma mais eficaz parece ser a popularíssima «pizza napolitana». É que, dizem os entendidos, nos negócios como na pizza, «o segredo está na massa».
TSF | 11.Fev.1998